Com toda a corresponsabilidade e muita estima, dirijo-vos estas palavras em plena Semana de Oração pelas Vocações. Corresponsabilidade, pois foi a todos nós que Jesus mandou pedir ao Senhor da Messe que mande trabalhadores para a sua messe. Estima, pois tudo acontece numa causa necessária, que vivemos em comunhão e afeto.

Trata-se de algo fundamental e que nos compromete a todos. Porque faltam ministros ordenados, especialmente sacerdotes, para servirem as comunidades como sacramentos visíveis de Cristo Pastor; e porque faltam irmãos e irmãs que, pelos votos e pela vida, sejam sinais convincentes do absoluto de Deus e da entrega total ao seu serviço. Do mundo para Deus e de Deus para a missão, é este o arco completo da vocação cristã. E particularmente daquela que o Papa Francisco, na sua Mensagem para o 52º Dia Mundial de Oração pelas Vocações (26 de Abril de 2015), designa muito sugestivamente como «vocação de especial dedicação ao serviço do Evangelho».

Mas há algo de urgente, nisto que vos digo com o Papa Francisco. Na verdade, e falando em geral, diluiu-se a dimensão vocacional da existência cristã. Na sensibilidade comum, a vida é encarada mais como realização à escolha do que como resposta a um apelo de Deus e dos outros, que nos esperam. Mais como da vida para mim, insaciavelmente, do que de mim para a vida do mundo, disponívelmente. E o pior é que ficamos tristes por não termos tudo, quanto só seríamos felizes se nos fizéssemos tudo para todos, segundo a vontade de Deus.

Creio que muita “iniciação” cristã não se realiza, de facto, porque não descobre nem desenvolve a dimensão vocacional da vida. – Quantos dos nossos adolescentes e jovens são estimulados a ouvir o chamamento divino, que lhes indicaria o que Deus espera deles e absolutamente os realizaria? Quando Paulo ouviu este chamamento e lhe correspondeu por inteiro, pôde escrever assim: «Nós fomos feitos por Deus, criados em Cristo Jesus, para vivermos na prática das boas obras que Deus de antemão preparou para nelas caminharmos» (Ef 2, 10). Mas é triste verificarmos como muita existência ficou por realizar, por não se descobrir o que Deus lhe oferecia, como apelo e missão. E porque na família e na comunidade nem sempre se acolhem, nem acompanham devidamente, os sinais de tal vocação…

Por isso falo de urgência, neste tempo forte de oração pelas vocações. Em cada família e comunidade cristã, a dimensão vocacional de tudo o que se faça é básica e diz respeito a todos. Temos de tomá-la tão a sério como à própria realização feliz de cada destino humano, só em Deus garantido.

Agradeço muitíssimo a quem se dedica directamente ao trabalho vocacional, nos seminários e no pré-seminário, nos institutos e comunidades, nos movimentos e grupos. Sei que é um trabalho árduo e que vai muitas vezes “contra a corrente” da sensibilidade ambiental a que acima aludi. Na verdade, leva a sair de si, num constante êxodo para Deus e para o mundo, em escuta e serviço. Mas é esta precisamente a vida de Cristo em nós, tal como Ele a viveu e a propôs.

Por isso reitero o reconhecimento e o estímulo aos que trabalham na pastoral vocacional e na formação sacerdotal, bem como de todas as vocações de especial consagração – ou especial “dedicação”, como escreve o Papa Francisco. É um trabalho indispensável, para que a missão de Jesus, que sempre chamou para sempre enviar, continue viva e salvadora na Igreja e no mundo.

Convosco, na escuta e na missão, + Manuel, Cardeal-Patriarca

Lisboa, 19 de Abril de 2015

Fonte: Patriarcado de Lisboa

http://www.patriarcado-lisboa.pt/site/index.php?cont_=40&id=4931&tem=349