O Patriarca de Lisboa considera que o principal desafio da catequese nos dias de hoje é concentrar e evidenciar a Pessoa de Jesus Cristo. Num Encontro Vicarial de Catequese, na Bobadela, D. Manuel Clemente falou da postura que a Igreja deve ter perante crianças de famílias monoparentais, abordou o novo modelo de estruturação da catequese e sublinhou a importância que a catequese teve na sua caminhada vocacional.
“O principal desafio da catequese no século XXI é evidenciar a Pessoa de Jesus Cristo”. A opinião é do Patriarca de Lisboa e foi expressa durante o Encontro Vicarial de Catequese, que decorreu na Bobadela, no passado dia 1 de novembro, no âmbito da Visita Pastoral à Vigararia de Sacavém. Perante cerca de centena e meia de catequistas desta vigararia, D. Manuel Clemente sublinhou a importância de falar de Cristo em todas as atividades da Igreja, em especial na catequese. “Nós somos cristãos, nós estamos aqui, neste serão, por causa de uma Pessoa. Alguém que viveu há dois mil anos e que inaugurou neste mundo uma outra maneira de viver. Essa outra maneira de viver continua a provocar em nós aquilo que provocava nos primeiros seguidores. Lembram-se o que é que os fariseus diziam: ‘Anda para aí esse sedutor!’. E Ele continua a seduzir-nos, a cativar-nos! Por isso, o grande desafio, hoje, é que, no meio de tudo quanto nós temos – igrejas, construções, instituições, processos, livros, tecnologias –, nada disto sufoque o essencial. E o essencial é que nós, em tudo quanto fazemos como Igreja, a começar pela catequese, falemos de Cristo, falemos com Cristo e partilhemos aquilo que vamos aprendendo com Ele, com esta presença viva que está no meio de nós e cujo eco é a catequese. Isto é fundamental! Que se evidencie na catequese a Pessoa de Cristo!”, adiantou.
Nesta sua partilha com os catequistas, o Patriarca de Lisboa reforçou a importância de Cristo vivo e do testemunho que os catequistas dão. “Este é o grande desafio da catequese: que no meio de tantas oportunidades, possibilidades, que por vezes são mais distrações do que propriamente conclusões e definições da vida, ressalte, de tudo isto, a Pessoa de Cristo! A catequese, e toda a ação da Igreja e aquilo que fazemos nas nossas comunidades, também pode ter esta conclusão: de tudo, sobressai a figura de Cristo vivo, a nossa vida com Ele e a presença d’Ele na nossa vida? Isso é que é catequese, porque Jesus passa de nós, uns para os outros!”, assegurou.
Como cativar as crianças?
A motivação das crianças para irem à catequese foi posta em questão, em comparação com a atração dos videojogos. Sublinhando desde logo que “as novas tecnologias, e concretamente tudo o que seja videojogos, podem ajudar mas podem também ser um problema, se isso introduzir a criança ou o adolescente num espaço puramente virtual e não lhe der o realismo do contacto humano”, D. Manuel Clemente frisou que “hoje em dia as famílias estão muito ocupadas, não têm muito tempo para estar com os miúdos, e arranjam esta maneira de eles estarem quietos”. “Mas essa é uma maneira que artificializa muito a vida”, alerta. “A relação virtual é uma relação virtual, que está ao alcance de um botão e que tanto aparece como desaparece. Ao passo que as pessoas são as pessoas e essas estão lá sempre! É preciso que nós aprendamos a relacionar-nos como pessoas, quer no espaço familiar, como no espaço escolar, como no espaço social, como no espaço de Igreja”. Desta forma, para o Patriarca de Lisboa, a motivação de uma criança para ir à catequese tem de ser proporcionada pela atração. “Precisamos de proporcionar o gosto da experiência, da inclusão e da participação. É um enorme desafio até em termos de futuro, não só de Igreja mas de sociedade, porque se nós ficamos muito dependentes deste hipnotismo tecnológico, depois também ficamos muito dependentes de gente que sabe que através das tecnologias pode levar uma multidão inteira num sentido ou noutro. Neste aspeto, a catequese pode dar uma ajuda muito grande, se nós criarmos grupos e ambientes que realmente cativem as crianças e os jovens, onde eles contam, onde eles possam falar e onde aprendam a falar, porque por vezes, nesse ambiente saturado de tecnologia, já nem a falar aprendem”, frisou.
Importância da catequese na caminhada vocacional
Nesta conversa com os catequistas da Vigararia de Sacavém, o Patriarca de Lisboa foi também questionado acerca da influência da catequese na sua vida vocacional. Sublinhando que a catequese “é uma recordação muito forte” na sua vida, “porque foi o primeiro contacto com a comunidade cristã, depois de já ter tido alguma iniciação catequética em casa”, D. Manuel Clemente assume que a catequese ajudou a estabelecer o seu caminho de Igreja. “Quer em casa, quer depois na comunidade paroquial, a catequese deu-me uma experiência de Igreja que ficou e que marcou, e que acabou também por determinar o meu próprio caminho, no sentido vocacional cristão, em geral, e sacerdotal, em particular”. Recordando os seus tempos de catequizando, D. Manuel Clemente salientou que nasceu numa família cristã. “Quando fui para a catequese, com cinco, seis anos, já não tive grandes surpresas no que diz respeito a saber o que é Deus, que Deus é Pai, que Jesus é irmão, que Nossa Senhora estava comigo, que podia contar com Eles. O Pai-Nosso e a Avé Maria aprendi em casa, antes de ir para a catequese paroquial propriamente dita”, revelou, sublinhando a importância das experiências feitas em casa e na paróquia. “Para que as palavras família ou filhos de Deus tenham um significado bonito, é preciso que elas evoquem, na nossa memória, coisas positivas. Se não, é mais difícil! A catequese não é apenas a transmissão teórica de conhecimentos, mas de uma vida, que corresponde a experiências que transmitimos uns aos outros”, observou.
As famílias e a catequese
As famílias monoparentais são uma realidade crescente na sociedade e a Igreja tem de estar preparada para esta realidade, entende o Patriarca. “É pena nós vivermos numa sociedade muito desagregada em Portugal”, referiu D. Manuel Clemente, neste encontro vicarial, sublinhando que “em Portugal, neste momento, 45 por cento das crianças nascem fora do matrimónio”. “É quase metade!”, alertou. “Quando nós, depois, na catequese, estivermos a falar de Deus como Pai, estivermos a falar de filhos de Deus, as palavras depois já não evocam, nessas crianças, os mesmos sentimentos que em muitos de nós evocaram. Temos de contar com isso e temos de suprir isso, na medida do possível, com as ajudas que tivermos”.
Ainda no que concerne aos pais das crianças da catequese, o Patriarca de Lisboa foi questionado sobre as iniciativas que os catequistas podem desenvolver para, também, catequizar os pais. D. Manuel Clemente apontou que “até aos sete, oito anos, há uma fase muito religiosa nas crianças”. “Alguns psicólogos e pedagogos até lhe chamam a infância adulta, antes depois daquele tumulto da adolescência”. Neste sentido, referiu, o testemunho das crianças pode tocar os pais. “Quando encontramos, sobretudo nessa altura, meninos e meninas com uma convicção, com um sentido espiritual das coisas, com um deslumbramento religioso que é impressionante, eles mexem muito com os pais e as mães e interrogam-nos muito acerca do testemunho cristão que dão”. Também por isso, acrescentou, “é muito importante fazer a ligação catequese-família e família-catequese”.
Ainda a propósito desta temática das famílias, o Patriarca de Lisboa apontou o projeto de catequese familiar que decorre em algumas paróquias da diocese. “São formas de catequese familiar, que envolve diretamente as famílias no processo catequético. É um caminho que se está a desvendar e que pode dar muito bons resultados, porque os pais depois acompanham mesmo a catequese, uma vez que os filhos ‘puxam’ por eles”, observou.
Avaliar novo modelo de estruturação da catequese
Sobre o atual modelo de estruturação da catequese, em que a Primeira Comunhão é feita no 3º ano e o Crisma no 10º, e questionado sobre a possibilidade de serem ministrados os três sacramentos da iniciação cristã (Batismo, Confirmação e Eucaristia) potencialmente logo no 3º ano tal como acontece em algumas paróquias, o Patriarca de Lisboa garante que a Igreja tem este tema em reflexão. “Este é, neste momento, um grande debate eclesial! Este é um assunto muito importante e toda a Igreja está muito empenhada nisto! Posso dizer-vos que há um ano estive no Sínodo dos Bispos e este ponto foi dos mais debatidos por bispos dos cinco continentes”. No entanto, assume, ainda não há decisões. “Em Lisboa, o Patriarca anterior, o senhor D. José Policarpo, permitiu que algumas paróquias que quisessem, digamos, ensaiar este outro processo, de dar o sacramento do Crisma antes da Primeira Comunhão, o começassem a fazer. É um processo que em Portugal só decorre na Diocese de Lisboa, mas é uma experiência que se está a fazer, mas que nós não sabemos muito bem como se vai seguir em termos gerais”. A expectativa de D. Manuel Clemente é que “ainda este ano pastoral 2013-14” seja feita “uma avaliação”. “Vamos juntar os párocos que têm este novo modelo de catequese implementado nas suas paróquias e vamos avaliar”, anunciou o Patriarca de Lisboa.
_________________
A realidade da catequese na Vigararia de Sacavém
Na Vigararia de Sacavém há perto de 2400 crianças e adolescentes na catequese, para cerca de 230 catequistas. Os números foram revelados ao Patriarca de Lisboa durante o Encontro Vicarial de Catequese, na Bobadela.
De entre as nove paróquias (Apelação, Bobadela, Camarate, Catujal, Prior Velho, Sacavém, Santa Iria de Azóia e São João da Talha e Unhos) que compõem a Vigararia de Sacavém, Santa Iria de Azóia destaca-se no número de crianças e adolescentes na catequese (perto de 650). Nesta partilha com D. Manuel Clemente e os seus dois Bispos Auxiliares, D. Joaquim Mendes e D. Nuno Brás, foram ainda apontadas algumas das dificuldades que são sentidas pela maioria das paróquias, tais como os poucos catequistas e a falta de experiência de alguns deles, a escassez de espaços para dar catequese e realizar atividades e também a realidade familiar pouco cristã de muitas crianças. Na sua apresentação, as paróquias mostraram igualmente as atividades que são realizadas com as crianças e adolescentes fora do espaço catequético, como passeios, representações, encontros, acampamentos ou acantonamentos.